Foi por
acaso que eu conheci o célebre morador do número 221B da Baker Street, se é que
coisas como o acaso existem. Eu tinha uns 12 anos e estava brincando no carro
do meu pai quando encontrei um exemplar de “O Sígno dos Quatro” no porta-luvas.
O livro foi esquecido ali pelo meu tio, e quando ele veio buscá-lo eu já havia
me apaixonado pelo personagem fantástico que é o Sr. Holmes, pela amizade fiel de
John Watson e pelo aspecto quase sobrenatural da Londres do século XIX.
Posso me
arriscar a dizer que esta obra influenciou de forma definitiva o meu futuro
amor pela leitura, e até mesmo por história, afinal, este período 1890-1920 é
um dos meus favoritos. O início do século 20 foi conturbado e abrupto, às vezes
se confundindo com o passado, às vezes correndo para o futuro.
Edição que me apresentou à literatura |
Em um
período bem curto eu li toda a obra publicada por Sir Arthur Conan Doyle
referente ao Sr. Sherlock Holmes, e até hoje obras passadas na Londres de 1890
me atraem e cativam. Ao longo dos anos, fui acompanhando as adaptações
cinematográficas ou para TV destes personagens tão queridos: um
filme antigo, com Basil Rathbone no papel principal e até mesmo uma adaptação
engraçaralha de Jô Soares, com seu “Xangô de Baker Street”, passando por “O
Enígma da Pirâmide”, filme de 1985. Mais recentemente fomos apresentados a
Robert Downey Jr. e seu Sherlock no que, pra mim, é um bom filme, mas que nada
leva do personagem original. Mas nenhum deles chamou tanto minha atenção e me
deixou tão besta na frente da TV quanto a série Sherlock, produzida pela British
Broadcasting Corporation, a BBC.
Esta série
nos apresenta a John H. Watson (Martin Freeman), veterano de guerra que volta a
Londres e busca alguém com quem possa dividir o aluguel. Através de um amigo
em comum, John é levado a conhecer Sherlock Holmes (Benedict Cumberbatch), que
aluga sozinho um flat na Baker Street
e está disposto a dividir as contas. John encontra o notável Sherlock em um
laboratório onde este faz testes químicos em um microscópio e os dois acertam
as coisas para que John se mude em breve. John acaba se envolvendo nos casos de
consultoria que Sherlock presta à Scotland Yard e, ao ver a incrível capacidade dedutiva de Holmes decide transcrever suas aventuras junto ao detetive.
Até aí,
nada de novo, certo? Certo, muito fiel aos livros, a não ser pelo fato de que a
série se passa nos dias atuais.
Esse aspecto da
série me deixou com o pé atrás, e ignorei-a por um tempo, mas quando finalmente
dei uma chance à adaptação, me surpreendi com a qualidade e o respeito pelos
personagens. É excelente.
Todos os
aspectos da personalidade de Sherlock estão presentes. É como se alguém tivesse
se perguntado “Como alguém como Sherlock
Holmes seria hoje em dia?” e seguido a partir daí. Sherlock é apresentado
como alguém que não se importa com os convívios e as amarras sociais, quase
beirando a sociopatia, mas esse traço de sua personalidade é bem medido pela
sua educação, o que resulta em um humor ácido e sincero, que, além de ser muito
justo ao Holmes de Doyle que preza a lógica e a verdade acima de tudo, torna a
série muito divertida.
Aliás, em
questão de diversão, Sherlock, mesmo
se tratando de uma série policial/drama é muito divertida! A relação
Sherlock-Watson é uma das melhores coisas desenvolvidas aqui, talvez por causa
da escolha de elenco, pois Freeman é um excelente ator, e consegue reagir às
situações absurdas em que é colocado de uma maneira sincera, como se tentasse
manter a sanidade frente aquilo, como quando Holmes surge todo sujo de sangue e
com um arpão na mão, dizendo que estava fazendo experimentos com um porco ou
quando John descobre que Sherlock não possui nenhum conhecimento de astronomia,
ignorando, inclusive, o fato de a Terra girar em torno do Sol. Ambas as
situações descritas nos livros.
John muitas
vezes acaba servindo como relações-públicas ou mesmo consciência social para
Holmes, devido aos seus hábitos solitários do detetive, mas a amizade dos dois é muito bem
desenvolvida, e conseguimos perceber perfeitamente o porquê de duas pessoas tão
diferentes serem amigas.
Martin Freeman e Benedict Cumberbatch como Watson e Sherlock. |
Benedict
Cumberbatch está sensacional no papel e, tanto fisicamente quanto em sua
atuação, consegue nos fazer acreditar que o que Sherlock Holmes faz não é
sobrenatural nem forçado, mas que se trata tudo de uma questão de observação, e
suas conversas com Watson servem quase como uma lição para o espectador e o
mais divertido é que, ao acompanhar os mistérios, nos pegamos tentando
descobrir o final, o que eu só consegui fazer em um episódio. Pois mesmo sendo baseadas nos contos originais, as histórias são originais, apesar de prestar uma bela homenagem à obra de Doyle. As tramas são
muito bem amarradas, mas tudo o que Sherlock vê nós também vemos. Não há
nenhuma informação oculta que só surge no final.
Eu amo o
personagem e poderia escrever textos e mais textos dizendo o quanto esta
adaptação é boa, mas no fim das contas, o que eu quero dizer é: Assistam! Quer
você goste ou não do personagem ou dos livros. É uma das melhores séries da atualidade e com certeza vale a pena! A produção conta com grandes
nomes como Steven Moffat, um dos homens por trás do aclamado Dr. Who, além de
contar com Cumberbatch, que vem se mostrando um ator excepcional, já tendo
atuado de forma brilhante em fitas como “Cavalo
de Guerra”, “O espião que sabia de
mais”, além de ícones do mundo nerd como “Além da escuridão – Star Trek” e “A Desolação de Smaug”; e Martin Freeman, que nos deu de presente a
melhor representação possível de Bilbo Bolseiro nos cinemas.
No momento
desta publicação, Sherlock conta com
3 temporadas com três episódios cada, e a quarta já foi confirmada. São poucos
episódios, ainda que tenham sua duração média de 90min.
Sherlock Holmes foi um personagem tão crível à época de sua criação por Conan Doyle que as pessoas endereçavam cartas ao 221B - Baker Street com seus mistérios e casos para Holmes e Watson, e esta série da BBC me fez acreditar que este homem poderia existir realmente.
Sherlock Holmes. |